Wednesday, March 7, 2018

Minha infância e adolescência, cheias de memórias e lembranças incríveis.


Crônica

    

                As coisas andaram. O mundo deu uma evoluída fantástica. Olho para esta garotada que está aí e percebo que já virei os 50, mas me remeto aos meus sete anos. Falo dos sete anos por que a partir daí tenho lembranças mais claras do meu passado. A TV lá em casa era preto e branco, mas a primeira TV na minha casa só chegou quando eu tinha nove anos. Antes disso o vizinho tinha comprado uma e eu ia lá assistir com os filhos dele. Naquela época a TV exibia alguns programas que eu adorava: Rin Tin Tin, Os Três Patetas, A Grande Família e por ai vai. Na minha infância não se ficava o tempo inteiro na frente da TV. Tudo tinha um horário determinado até por que o meu lazer preferido quando criança era ‘jogar taco’. Isso sem falar nas bolinhas de gude, futebol, andar de patinete, carrinho de lomba com rolimãs, subir o morro que tinha perto de casa, andar de bicicleta, dentre outras diversões inesquecíveis.

                A nostalgia me leva ao meu passado, que foi simplesmente espetacular. Amo minhas lembranças de criança. Não posso esquecer os meus anos de internato na escola. Isso mesmo. Eu ficava a semana inteira na escola, literalmente internado, e só voltava para casa nos finais de semana. Depois de quatro anos no internato integral da escola, minha mãe me transferiu para outra escola. Passei para o semi-internato, ou seja, eu passava o dia inteiro na escola e só voltava para casa à noite. Essa coisa de ‘internato na escola’, para alguns pode parecer um tipo de prisão, uma coisa apavorante. Quando comento isso, as pessoas não compreendem o valor que tinha e tem hoje em dia um colégio interno. No colégio interno se aprende de tudo, inclusive o convívio sadio entre meninas e meninos. Os colégios internos que frequentei eram mistos; meninos e meninas.

Isso aconteceu no ano de 1967. A concorrência era ferrenha. Conseguir uma vaga em um colégio interno era mais difícil que conseguir passar no vestibular nos dias de hoje. Era uma média de 200 candidatos por vaga. Era também muito caro e parece que continua até hoje. É fácil imaginar por que: cama, mesa, banho, estudos, roupa lavada, atividades, e ficar uma semana inteira na escola saindo só nos finais de semana, definitivamente não era para qualquer um. Custava uma ‘grana preta’ e volto a repetir, custa até hoje, escola de turno integral é algo especial para os pais que querem dar uma educação diferenciada para os seus filhos. Nos dois primeiros dias na escola interna eu chorei, queria voltar para casa. Eu tinha apenas sete anos. Mas tudo se tornou familiar muito rápido. Dividir o dormitório com mais de 100 crianças não era fácil. Porém a privacidade de cada um não era violada. O banheiro era para 30 pessoas. Então ele possuía: 30 chuveiros, 30 pias e 30 vasos, etc.

Era obrigatório ser solidário nesse ambiente coletivo. Fazia parte da educação coisas como: turmas alternadas de crianças para limpar e usar os banheiros e para tomar banho. Ao acordar de manhã todos tinham que arrumar suas camas e ficar ao lado delas para uma supervisão da freira. Tínhamos que ajudar dois garotos dos total de 100 que faziam xixi ou cocô na cama, todos se revezavam nesta função. Escovar os dentes tinha horário. Na verdade tudo tinha horário. Só não tínhamos horário para utilizar os banheiros. Lembro-me com carinho que o colégio tinha uma grande horta. Uma vez por semana nós éramos encarregados de cuidar dela. Ali nós plantávamos mudas e capinávamos os matinhos que cismavam em crescer ao redor das hortaliças. A horta era linda. Colhíamos laranjas do pé, bergamota, pêra, goiaba, dentre outras frutas.

                Volta e meia tínhamos competições com outras escolas, desfiles na rua principal da cidade de Viamão, RS, apresentações, jogos, dentre outras disputas. O prédio do colégio era administrado pelas freiras. É um prédio enorme de três andares e lembra um grande convento. Devia mesmo ser um convento devido ao grande número de freiras vivendo e trabalhando lá. O prédio possuía duas alas: a ala masculina e a feminina. Durante o período de aulas, as refeições e as atividades eram coletivas. Meninas e meninos ficavam juntos, sob o forte controle das freiras. Minhas notas eram muito boas. Não tinha como ser diferente. Era tudo muito organizado. Não tinha outro jeito. Tinha que estudar.

                Todas as roupas de uso pessoal, tais como: cama e banho, etc., eram identificadas com o número 110. Quando precisava de alguma roupa, qualquer que fosse eu me dirigia ao balcão da rouparia dizia o meu número e pegava o que eu precisava. Repetindo, éramos 100 meninos e mais 100 meninas do outro lado. A escola existe até hoje. Não mais em regime de internato. O nome dela é Stella Maris. Ela fica na cidade de Viamão, no Rio Grande do Sul.

                Como já disse anteriormente colégio interno era coisa cara, coisa de gente rica. Minha mãe não tinha como pagar. Eu entrei no colégio Stella Maris com uma bolsa de estudos, mas minha mãe me avisou que se eu ‘rodasse’ algum ano perderia a bolsa, então eu tinha que fazer a minha parte de ter um bom desempenho. Minha mãe gastou uma fortuna para comprar o meu enxoval e coisas para o meu uso pessoal na escola, além de bordar peça por peça com o número 110. O bordado era vermelho. Lembro-me como se fosse hoje.

Eu vivia com minha tia-mãe adotiva. Ela era solteira e era irmã da minha mãe verdadeira. Logo tudo em casa. Ela me criou desde o primeiro ano de vida e me adotou de fato quando eu fiz seis anos. Fizemos um combinado de eu não perder nenhum ano para que o sacrifício dela em me ajudar com aquela educação diferenciada, conseguindo a tão sonhada bolsa, não ser em vão. Eu não queria decepcioná-la.  Eu não tinha o direito de tirar notas ruins, e fiz a minha parte nunca perdi nenhum ano.

                Minhas notas sempre foram ótimas. Ainda guardo os meus boletins do Stella Maris em minha casa aqui em Malden, MA. Minha mãe Dalila era fantástica, guardou tudo que podia e achava relevante da minha infância. Ela me deu minhas memórias destes tempos depois que passei dos 20 anos. Fiquei internado no Colégio Stella Maris do primeiro ao quarto ano primário. Saí então do sistema de internato e passei para o sistema de semi-internato. Nessa época eu passava o dia inteiro na escola e à noite voltava para casa, mas não era mais o colégio Stella Maris, era a Escola São José em Porto Alegre bem no centro da cidade ( sai do interior e fui para capital do estado), que depois de um tempo mudou o nome para Escola Medianeira. Ela também era administrada por freiras e padres. E lá estava eu com a minha bolsa de estudos. Essa escola ficava na Av. Alberto Bins em Porto Alegre, ao lado do Hotel mais luxuoso da cidade à época: o Plaza São Rafael. Um hotel 5 estrelas que está no mesmo endereço e continua funcionando. Àquela época o hotel parecia coisa do outro mundo.

                Minha mãe trabalhava duro. Solteira. Só eu e ela em casa. Ela era vendedora nas famosas Casas Pernambucanas. Tinha um bom salário. Nossa casa era grande e própria. Vivíamos bem. Sou muito grato a ela pela boa educação que me deu. A Dalila, minha mãe adotiva, já não está mais entre nós, mas eu tive tempo de cuti-la muito.  Eu já morava nos Estados Unidos quando ela veio a falecer,  mas eu já possuía o Green Card e tive oportunidade de visitá-la várias vezes no Brasil. Ela morreu com mais de 80 anos. Bem vividos. Tenho muito orgulho dela. Ainda sinto sua falta. Ela sempre foi e ainda é um grande exemplo de vida para mim. Seus ensinamentos andam comigo até hoje. Meus filhos vivem e praticam parte destes ensinamentos que acreditam tenham vindo de mim, mas muita coisa veio dela. Bons tempos!




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